Querido filho, como
se estivesse olhando para o passado, vi-me caminhando por um jardim, onde
estavam distribuídas várias cestas no chão. Havia bebezinhos dentro. Uma voz começou
a falar que um de meus óvulos estava prestes a ser fecundado e, portanto, em
breve me tornaria mãe. Aqueles eram os candidatos que esperavam a oportunidade
de nascer. Notei que etiquetas estavam presas na lateral das alças. Cada
criança tinha uma frase correspondente, como se fosse a descrição de um produto.
Interessada no conteúdo daqueles papéis pendurados, li alguns de forma
aleatória. Um dizia que aquela filha me daria muitos netos. Outro dizia que
aquele filho me encheria de orgulho. Teve papéis dizendo que determinado filho
ou filha retribuiria meu afeto, dividiria comigo seus segredos, me cobriria de
cuidados na velhice, etc. Mas quando o encontrei, não tive mais dúvidas de qual
filho deveria escolher. Sua etiqueta dizia que você me faria desvendar o
infinito.
— Pronto! Achei
meu filho. É este que eu quero.
Encerrado o
assunto, fui saindo, sem me preocupar com mais nada. Antes de me afastar por
completo, porém, a voz me chamou:
— Não quer
saber como ele vai fazer isso?
Não senti necessidade
de receber explicação. Era exatamente você que eu desejava. Qualquer detalhe era
irrelevante. Mas é lógico que quem almeja alcançar um bem tão grande precisa
fazer um esforço da mesma proporção. Quando o escolhi, dei asas a uma aspiração
audaciosa. Não foi fácil aceitar que não viveríamos juntos todos aqueles anos
que pretendia passar ao seu lado. Mas, foi apenas através desse obstáculo que
pude descobrir que o amor não precisa da matéria, para continuar pulsando
eternamente. Hoje entendo que, se não tivesse me submetido a essa luta, nunca
poderia ter comprovado que a força do amor é capaz de vencer todas as
barreiras!
Se alguma vez
você tiver se acanhado, por achar que sua partida frustraria meus planos, fique
sabendo que nunca fez nada para me desapontar. Você me ensinou tantas coisas, que
saber que ficaria pouco tempo aqui não teria mudado minha decisão. Você não é o
filho que vai me convidar para a sua formatura, nem para o seu casamento, mas é
o único filho que eu gostaria de ter!
Um forte abraço
da sua mãe,
Flavia Camargo.
Rio de Janeiro,
17 de maio de 2015.
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